Wednesday, August 30, 2006

Morena

"só levo a saudade, morena,
é tudo o que vale a pena"
Marcelo Camelo, in Sapato Novo

"As frases são minhas,
as verdades são tuas.
Enquanto te desejo me vejo
chorando no meio da rua"
Zeca Baleiro, in Versos perdidos


Eu era o par, ela o ímpar.
Ela é o sol, eu, a lua.
Yin e Yang. Eu, paixão,
ela, razão.

Amizade mais perfeita que construí.
Tão perfeita, que, sendo egoísta,
me apaixonei.

Querendo roubá-la
só para mim.

Porém, de tanto esconder
esse amor, e de tal modo,
nem eu mesmo soube quando vi.

Quando ele pôde chegar a superfície,
inevitável foi minha descoberta.
Tudo jazia tarde demais,
muito errado.

Por isso, hoje...

Conto os números de par em par,
passo os dias admirando a lua.
E me apaixono, sempre, sem razão.

Thiago Augusto
(26-08-06)

Monday, August 28, 2006

Mariana - Parte II




Passados 8 min, Mariana sentiu-se indisposta. Um mal-estar repentino apoderou-se de seu corpo e uma sonolência incontrolável assolou-a. Olhou com desespero para o sorriso sutil que Fábio a lançou enquanto oferecia-se para levá-la dali. “Não se preocupem, acho que ela passou da cota de novo.”. Um calafrio percorreu seu corpo enquanto ele a levava para o seu carro e não conseguia esboçar nenhuma reação até que finalmente as luzes se foram.

Mariana via-se andando em um corredor muito extenso com uma luz em seu fim. Correu até essa luz e viu-se em um quarto totalmente ocupado com essa luz. Era tão ofuscante que demorou a acostumar-se com a mesma. Aos poucos ela esvaeceu e percebeu que era uma sala com telas em todas as paredes e parecia estar flutuando em um abismo de branco infinito. Sentia-se perdida e não encontrava mais um jeito de sair da sala. Ao passar o desespero inicial, pôs-se a observar as telas nas paredes. Eram seus ex-namorados, rolos, paqueras virtuais. Encontrou o momento de seu primeiro beijo, o momento que fez suas primeiras juras de amor e quando as rompeu pela primeira novidade que surgiu em sua vida. Era estranho ver o outro lado, como seu namoradinho chorara, deixara de comer durante um tempo, como o magoara. Por um segundo passou por sua cabeça uma ponta de remorso que logo foi embora quando o viu com outra garota, feliz, com coisas que ela jamais seria capaz de proporcionar.

Sentiu-se mal, novamente, e as vozes de alegria contrastadas com dor e pranto foram ensurdecendo-a. Visões de alguns que não foram tão felizes inundaram sua cabeça como chuvas torrenciais até que uma imagem congelou. Como em câmera lenta, viu um de seus últimos namorados-relâmpago com uma arma na mão. A arma apontada para a cabeça e o trêmulo dedo apertando o gatilho. Apesar de seus gritos desesperados, a bala saiu e espalhou o seu cérebro pela tela, atravessando-a e caindo em seu rosto, misturando sangue às lágrimas. Um último grito a despertou.

Continua...

Eduardo Leite

Friday, August 25, 2006

Depois da primeira vez

Ele, no assento do motorista, segue nervoso e pensa coisas que não pode dizer para quem está ao seu lado, também nervosa. Mas, ao contrário dos pensamentos dele, os dela poderiam ser revelados sem trazer dano algum.

Calados. Eles estão calados. As poucas palavras ditas são ditas mais para um ser inexistente dentro daquele carro. Não há diálogos, apenas curtos monólogos.

O fato a ser consumado dentro de alguns minutos foi estudado e planejado por ambos durante dias. O álibe de uma festa de aniversário, o presente comprado por ela, para o tio dele, que receberia felicitações por telefone, pois eles iriam ao aniversário do tio dela (a desculpa que ele deu em casa para não ir à festa do único irmão de seu pai). O presente, seria entregue no dia seguinte, por ambos.

Voltar. Ele pensa em voltar. Mas pensa também que essa idéia é apenas uma conseqüência do estado emocional em que se encontra: ansioso, nervoso. Há confusão em sua mente. Tenta ignorar seus pensamentos, tenta pensar em alguma outra coisa.

E mais um longo silêncio. Ele dirige devagar. Suas mãos e pernas tremem um pouco.

Um pouco.

Enquanto que ela imagina como deve ser. Se vai doer. Se vai sangrar. Se vai gostar. Se é muito grande. Mas não fala. Ela não fala. Ela quer. O falo.

Ele não. Ele não está preocupado com isso. Em como deve ser. Se vai doer. Se vai sangrar. Se ela vai gostar. Não é isso. Nunca foi.

Chegaram no lugar escolhido. A casa dele. Vazia. Saíram todos para o tal aniversário. Tinham duas horas para fazer tudo, no mínimo.

E então aconteceu.

A dor física, o sangue, o tamanho, nada disso importou para ela. Estava deitada com o homem que escolhera para ser o seu primeiro – e único – homem. Adormeceu, ainda nos braços do gozo.

Ele encarava o teto branco de seu quarto. Pensando no que acabara de fazer.

Levantou-se, tomando cuidado para não acordá-la. Procurou caneta e papel. Escreveu um bilhete que colocaria na bolsa dela, antes de deixá-la em casa.

Com os dizeres “eu não te amo mais”.


Rafael Rodrigues

Wednesday, August 23, 2006

3 Vozes convida: Sol Moras Segabinaze

* Conheci o Sol Moras no coletivo Pessoas do Século Passado (link aí do lado), há um bom tempo já. Conheci entre aspas, porque só conheço seus textos. Trocamos algumas mensagens via e-mail e, anualmente, scraps desejando feliz aniversário e feliz ano novo. Mas o cara manda muito bem nos textos e, pelo que conheço dele, é um cara muito legal.

Enjoy!,
Rafael


napoleão bonaparte ou buza ferraz

Quem sabe o que atrasa o Brasil não pode ficar blasé, com medo de ferir os sentimentos ideológicos da galera que ainda acredita existir justiça no socialismo. “É a jihad do Sol”. Não é exagero. Lula e Heloísa Helena têm 65% das intenções de voto no Rio de Janeiro. Mas aí vem uma pesquisa e diz que 47% dos brasileiros são de “direita”. Estranho. E a maconha? Continua dando jaula para 79%.

Socialista de shopping-center.

A imagem de justiceiros sociais de Lula e Heloísa Helena permanece com apelo. Será que HH assiste “Friends”? Muitos dos seus eleitores assistem. A lógica em curto-circuito. Será que essas pessoas sabem o que HH está REALMENTE propondo? Pense bem. Te dou uns segundinhos... TÉÉÉÉÉ!!! Tempo esgotado.

Aí entra o anunciante e diz: “Bem-vindo à sua liberdade.” Quem realmente defende a liberdade?

CUBA ou EUA?

Pense bem. Vou mijar enquanto você raciocina... TÉÉÉÉÉ!!!

Maçã boa. Mas vocês concordam que cada povo tem o governo que merece? Elocubra. Vou dar uma mordida aqui... TÉÉÉÉÉ!!!

SE OS AMERICANOS QUISESSEM DERRUBAR FIDEL

A liberdade vai prevalecer, cedo ou tarde. Aliás, é o capitalismo que mantém o fiapo da economia cubana. O turismo e o dinheiro vindo dos refugiados em Miami. Mais o petróleo do Chávez. Socialismo é escravidão. Cuba é uma prisão. Vai continuar relativizando o Fidel? Pensa bem. Questione o seu anti-americanismo no fundo do seu coração... TÉÉÉÉÉ!!!

"Cuba tem coisas boas e ruins." Veja só então o que uma refugiada de balsa falou na Globonews: "A tão mencionada educação cubana é uma farsa. Todos os livros usados e permitidos são pra exaltar o castrismo. O pensamento é controlado."

"A saúde só é boa pros turistas com dólares e euros. A população não tem acesso aos remédios, permanentemente em falta."

http://www.therealcuba.com/

BUZA FERRAZ É UM NOME INCRÍVEL

Agora mesmo na FLIP um manifesto contra quem? Israel. Não é uma lindeza? Um país democrático é ATACADO por centenas de mísseis lançados por FANÁTICOS RELIGIOSOS que desejam ABERTAMENTE a sua DESTRUIÇÃO. Esse país REAGE e os INTELECTUAIS o declaram CULPADO. A lógica em curto-circuito. "Reação desproporcional!!" Você queria que Israel recepcionasse os terroristas com kibes e kebabs? TÉÉÉÉÉ!!!

"Cara irritante..."

Por que não vejo os artistas "campeões da liberdade" dando os seus autógrafos contra Cuba? Tariq Ali vive confortavelmente ali no capitalismo inglês falando mal do capitalismo. Uma profissão em expansão.

Irã, Síria, Al Qaeda, Hamas e Hezbollah. Repúdio neles, começando pelas suas próprias sociedades, ao invés de serem transformados em mártires de uma luta insana contra a civilização ocidental. Ou você justifica o terrorismo islâmico? Think again... TÉÉÉÉÉ!!!

"As mudanças começam dentro de cada um." Certamente, individualmente.

Capitalismo é liberdade. Que moral tem alguém que defende a escravidão em 2006? Divague... Confronte aqueles filósofos franceses e alemães que os seus professores disseram que eram o "creme" da sabedoria ... TÉÉÉÉÉ!!! Uma desmoralização total do marxismo, é disso que o Brasil precisa.

Qual era a do Napoleão Bonaparte aliás? Dominar o mundo? Aquilo sim era imperialismo. Loucas e sangrentas batalhas de mosquete. Todos os países se beneficiam da globalização, ao contrário do que é doutrinado por aí.

Mas a FLIP não se restringiu aos delírios. Christopher Hitchens também esteve lá. No O Globo: "O Hezbollah é o braço armado do governo do Irã, um lugar onde qualquer escritor digno de nome está preso, no exílio ou executado. Acho que não é tarde para os que assinaram o manifesto retirem seus nomes desse documento desonesto e covarde."

TÉÉÉÉÉ!!!



Sol Moras Segabinaze

Sunday, August 20, 2006

A voz do escritor

"Meu tema é o escrever imaginativo e como lê-lo: primeiro como um escritor desenvolve uma voz própria e uma presença na página; a seguir, como o leitor aprende a escutar essa voz e reagir a ela, e, finalmente, como a verdadeira voz e a personalidade pública às vezes entram em choque, se confundem e se contradizem."

É assim que o escritor e crítico literário inglês A. Alvarez inicia o prefácio de seu livro "A voz do escritor" (Civilização Brasileira, 160 págs.).

É bom deixar claro que não se trata de um manual a ser seguido, ou uma cartilha. Afinal, não existem regras que todo leitor ou escritor deve seguir. E A. Alvarez não propõe isso. O que ele faz em "A voz do escritor" é partilhar um pouco de sua experiência com quem se dispõe a ler sua mais recente obra publicada em terras tupiniquins.

Na primeira parte do livro, Alvarez cita vários autores e nos mostra como ou em que momento de suas vidas eles encontraram a tal "voz" própria, que não é a mesma coisa que "estilo": "Estilo, como já disse, é diferente de voz, e às vezes o estilo que você tanto trabalhou para adquirir - o seu estilo - atrapalha o que você quer dizer."

Já a definição de "voz", Alvarez deixa por conta de Philip Roth, que diz: "Não pretendo ter estilo... Eu quero ter voz: algo que começa mais ou menos na parte de trás dos joelhos e chega até bem acima da cabeça."

A segunda parte de "A voz do escritor" é dedicada aos leitores. "O bom leitor escuta (a voz) com a mesma atenção com que o escritor escreve, ouvindo tons e subtons, alterações de altura, e tão envolvido e atento como se estivesse numa conversa com o escritor." E mais: diz que ler "É até mesmo, a seu modo, uma arte."

Esse leitor a que Alvarez se refere é o leitor que busca na literatura algo mais que uma simples leitura. É o leitor que deseja compreender a obra em toda sua amplitude, que deseja descobrir o que se esconde nas entrelinhas.

"O culto da personalidade e o mito do artista" é o título da terceira e última parte do livro. Nela, Alvarez disserta sobre o fato de hoje existir um "culto da personalidade" que antigamente não havia. Ele conta quando isso provavelmente começou. Em 1966, Alvarez foi a uma leitura de poesias que o americano Allen Ginsberg (autor de "O uivo", poema idolatrado pela geração beatnick e por seus seguidores, até hoje) promoveu na universidade de Buffalo, em Nova Iorque: "O público era grande demais para um auditório, de modo que ele se apresentou no ginásio de basquete, que tinha assentos para centenas de pessoas (...) Agora compreendo que o que eu estava presenciando naquela noite em Buffalo era algo novo e estranho: a transformação da poesia em showbiz."

Contando casos, analisando poemas, reproduzindo declarações de autores, A. Alvarez não enumera regras em seu "A voz do escritor". Ele aponta caminhos. É como naquele ditado: "melhor que dar o peixe, é ensinar a pescar", ou algo semelhante.

Portanto, quem realmente gosta de literatura, seja escritor ou leitor, não pode deixar de conferir os conselhos de A. Alvarez.


Rafael Rodrigues

Thursday, August 17, 2006

Xadrez

Inesperado era aquele pacote. Curto, seco. Somente com o nome dela escrito de um lado do papel pardo.

Desfez com cuidado a embalagem. Dentro havia uma caixinha de madeira de formato pequeno. Nela, um lacre manual que, usando uma das mãos, se quebraria de maneira fácil.

Ela ficou receosa ao abri-lo; não que tivesse medo do que havia dentro, mas tudo já era tão inesperado. Fechou os olhos, abriu a caixa. Viva sobre suas mãos, demorou a olhar seu conteúdo.

Dentro havia uma unica peça, um rei, também feito de madeira. Retirando-o com cuidado, pôde notar que embaixo havia também um manuscrito, dobrado diversas vezes para se encaixar lá dentro.

Retirou o papel cautelosamente, leu as poucas palavras dentro dele. "Eu cesso o jogo, derrubo meu rei, tiro-o do tabuleiro deixando em suas mãos. Nessa guerra combatida pelo meu amor e seu desprezo, perdi. E parto agora sem demora, sem uma nota para dizer adeus."

As lágrimas invadiram seu rosto, não pela forma furtiva como ele fora embora. Mas ela sabia de alguma forma que todos seus amores seriam assim, um eterno jogo arredio de finais descontentes e perdas incotestáveis.


Thiago Augusto
(14-05-06)

Friday, August 11, 2006

Mariana - Parte I

Mariana chegou ao bar combinado com 10 min de atraso, sentou no balcão como que para ser vista por toda e qualquer pessoa que entrasse. Com sua mini-saia delineando as coxas roliças. Sua blusinha vermelha de botões, esta valorizava seu pequeno e brilhante piercing de umbigo que adornava sua “barriguinha” seca, malhada, porém não definida por completo. Balançava suas lindas mechas claras de um lado para o outro e vez por outra descruzava as pernas na esperança que seu paquera virtual estivesse por perto. Como este se atrasara mais que a própria, resolveu ir ao toalete retocar o batom.

Esta garota de apenas 17 anos já era experta na arte de apaixonar-se e apaixonar usando de toda sua sedução e lascívia inatas. Conhecera Fábio como todos os outros, através de seu orkut. Ela não havia ido atrás deste, não dessa vez. Percebera que ele era um visitante freqüente de seu espaço e resolveu puxar papo. Rendeu-lhe o fim do namoro, mas o Fábio passava tanta confiança que parecia ser capaz de preencher seu vazio, como todos os outros não o haviam feito. Prometera para si mesma que dessa vez seria a última “traição virtual”.

Passando o batom em seus carnudos lábios, sentiu esvair de si toda culpa pela situação. Tornara-se catedrática em mentir para si mesma. E fazendo uma simulação de um olhar fatal despediu-se do espelho. Saiu do banheiro disposta a dar mais 5 min ao carinhoso e criativo paquera virtual.

Sua cadeira encontrava-se ocupada assim que chegou e ela já avistava outras até caiu em si. “Que gato que sentou em minha cadeira!”. Não demorou para soltar algo: “Com licença.”, Disse num sorriso matreiro, “Creio que o senhor se sentou em meu lugar.”. Percebeu surpresa no olhar do rapaz que logo pôs-se de pé para dirigir-lhe uma resposta: “Que coisa feia! Paquerando outros homens enquanto eu peço a sua bebida.”. Reconheceu o Fábio e surpreendeu-se de como era mais bonito pessoalmente. Deixou escapar um riso blasé e apanhou o Martini que erguia-se do lado de sua bebida. Sentaram-se e conversaram.

Continua...


Eduardo Leite

Thursday, August 10, 2006

Entresafra

Passei um bom tempo na cama, olhando para um ponto qualquer em meu quarto, pensando sobre o quê escrever.

Depois de alguns minutos sem uma idéia decente, algumas lembranças surgiram em minha mente. A maioria era do meu tempo de criança. Algumas eram do adolescente que fui até alguns anos atrás. Mas não achei que fosse uma boa idéia escrever sobre as besteiras que fiz. E, como minhas lembranças de menino não são 100% confiáveis (até hoje não sei dizer se algumas delas são verdades ou invenções), continuei na estaca zero.

Nesse meio tempo, dei fim à vida de alguns mosquitos que estavam – e continuam, enquanto escrevo isto – me tirando a paciência.

A essa altura eu já havia desistido de escrever qualquer coisa. E fiquei pensando como é que Fernando Sabino, Rubem Braga e Antônio Maria, só para citar três dos maiores cronistas brasileiros, conseguiam escrever tantas coisas e tão bem.

Tenho consciência de que a vida deles foi mais agitada que a minha. Mas, que diabos, eu poderia escrever sobre tanta coisa. O fato é que não estou em uma noite inspirada. Aliás, já faz algum tempo que as noites não me trazem qualquer inspiração. Os dias então, pior ainda.

O tempo não pára. O mundo não pára. Tudo acontece ao mesmo tempo agora. E por mais que eu saiba disso, as idéias não me vêm claras. Elas aparecem aos pedaços, várias ao mesmo tempo, e logo vão embora, sem me dar uma oportunidade de aproveitá-las.

Espero que essa fase improdutiva passe logo. Não gosto de tentar enganar ninguém com textos como esse.


Rafael Rodrigues

Monday, August 07, 2006

Agridoce

Decerto eu poderia fingir muito bem aos outros. Embora possa sentir que minha tristeza já se expande além de meus conhecimentos físicos, começando a invadir o tom de minha voz, petrificando meu rosto bem devagar.

Mas como ator que sou, da vida, dos palcos e do espetáculo, é certo que poderia borrar-me com maquiagem, viciar meus olhos no espelho, até convencer a mim mesmo, ou a um eu fictício, de que tudo caminha da melhor maneira possível. E assim, andar pelos campos sorrindo, feliz, a bailar com os estranhos que passam. Beijando na testa cada um de meus amigos, de forma sensível e louca.

Eu poderia colocar minha melhor roupa, caminhar de uma forma majestosa, cantando a canção da estação. Dizendo a todos que a falta foi sentida, que o mundo gira cada vez mais redondinho e melhor.

Tudo isso, minha encenação em vida, meu espetáculo circense a cada segundo, poderia ser aceitavelmente plausível se eu fosse outra pessoa. Mas como sou agora, como sempre fui, tolo e outros adjetivos, é quase impossível fingir-me feliz quando por dentro nem sinto o coração pulsar. E quando sinto, ele pulsa de um asco violento, querendo explodir-se em cacos, cansado, mas forte.

Nessas horas, enquanto dói-me o peito, o cérebro se foca. Pensa na existência, tanto de si próprio quanto dos homens. Sou apenas pouco, sei disso, mas não compreendo por que me vejo tão diferente daquilo que são, humanos. Por que minhas preferências são diferentes, meus caminhos, se não profundos, ao menos não contêm minha razão, e sim meu amor. Nessa hora que me sinto como uma relíquia, ao saber que os poucos amigos que estão comigo, compartilham da mesma irmandade, eu vejo os rostos de cada um em minha mente. Pensando que daqui a algum tempo, levaremos com nossa extinção algo que já não existe em grandes porções sob a terra.

Sou todo amor e sentimento. Desses que fazem um acordo com as palavras, só para brincar com elas no jardim. Semeando-as pouco a pouco em minhas idéias, meus amores, meus sentimentos extintos. Uma vez, lembro-me, escrevi que sou uma equação matemática, tirando de mim meus amores e minhas palavras, nada sobra. Sou feito de uma força inconstante, pura, que não bebe da fonte da razão, pois ela me desconcerta a cada instante.

E já ando por demais desconcertado, bêbado de meus amores que não me amam, e dos meus sentimentos que se atropelam, e sempre conseguem se machucar ainda mais quando resolvem caminhar pelo mundo.

Ando pouco pelas avenidas. Afirmo que em tempos passados era meu despertar favorito. Caminhar, mãos nos bolsos, observando as pessoas em seu dia a dia. Vendo a poesia que morre por não prestarem atenção. Já hoje...

Hoje o mundo me acua. Me deixando de lado, batendo-me com unhas e dentes. Caminho alguns quarteirões sujos e volto para casa para vomitar. Os valores que vejo lá fora já arrepiam minha espinha, me fazem contorcer de dor por eu ser assim, humano. Demasiado humano.

Deus é um homem sábio, podem confiar. Há quem diga que um dia ele virá, dizimando toda nossa podridão. Porém, ele sabe que de apoio externo não precisamos, somos nossa própria destruição. Nosso gérmen podre fora plantado há muito tempo. Mas o vírus é lento. Estamos apodrecendo aos poucos, comendo a carne um do outro, chafurdando na lama. Louvando as fezes no meio do lodo.

E eu, sintam pena; quando nasci me tornei amante da humanidade. Da humanidade e das bestas, que riem de forma jocosa, uma gargalhada docemente amarga. Que sinto ecoar nos meus ouvidos, enquanto uivamos para a lua, nos banhando no lixo.

Minha existência me comove, sempre, a cada instante. A humanidade me fascina, me machuca, por não sermos mais humanos. Meu sangue ainda escorre quando me corto, prova que ainda meu corpo responde a vida. Minha alma, já não sei. Talvez bem lá no fundo ela ainda seja fiel a si mesma. Devo mergulhar dentro de mim e resgatá-la? Ou deixá-la morta para sempre?

Cabe aos senhores um aviso. Caso me vejam na rua, quebrando janelas, lambendo virgens como um animal, arrancando o coração dos homens com minhas próprias mãos, peço que acabem com minha vida ali mesmo. Lá, dentro daquele homem, só haverá um olhar fixo, impuro, lúcido, de um monstro. E aqui, nesse espetáculo, já possuímos muitas anomalias.

Eles mataram aquilo que sou; no final, já estou morto. Crucificado em praça pública. Ainda vivo, pedindo ajuda, enquanto os porcos riem de meu corpo machucado e dos meus pés quebrados. Enquanto eu olho para o céu à toa, vendo o sol comer minhas retinas.


Thiago Augusto
(06-08-06)

Friday, August 04, 2006

Como fazer pra não broxar

Não, eu não sou mágico, nem faço comércio ilegal de Viagra. Alguém digitou a frase que dá título a este texto e acabou caindo no meu blog. Isso porque, em um post anterior, está digitada a palavra “broxar”.

Para não perder o leitor, e atrair outros, resolvi me passar por psicólogo ou confidente, e tentar ajudar, mesmo que apenas com palavras e clichês.

Para não broxar, meu caro, tú tens que estar com uma mulher inteligente. É o primeiro requisito. Ela não precisa entender de física quântica ou ter lido Nietszche, Voltaire ou Hegel. Apesar de que uma boa dose de cultura é necessária. Afinal, você não quer conversar com uma porta, certo? E se a dita cuja não tiver nada na caixola, complica. Quando ela disser que o último livro que ela leu foi no colégio, aí sim, você vai broxar.

Mas ela precisa ter um outro tipo de inteligência também. Inteligência lasciva, compreende? Ela precisa saber te conduzir, e conduzir as preliminares. Porque, pelo visto, você não está lá com muito jeito para a coisa.

Tens também que escolher uma mulher vaidosa para ser tua parceira na cama. Mas não aquela mulher que exagera na vaidade, que demora uma hora - ou mais - para se vestir. A vaidade a qual me refiro é a seguinte: a de ela querer te deixar maluco, meu caro. De ela querer te proporcionar a maior foda de tua vida. Para você depois dizer “essa foi a melhor foda de minha vida, benzinho”. E, é claro, de se vestir bem, mas de forma simples, de estar cheirosa, e com uma inspirada lingierie.

Mas a mulher, sozinha, não resolve a tua situação. Você precisa ficar tranquilo, rapaz! Não pode ficar se cobrando demais. Viu o que aconteceu com o Ronaldinho Gaúcho na copa, não viu? Ele broxou. Porque esperavam demais dele. Então, mantenha a calma, pois o time ganha jogando em conjunto.

Outra coisa: não queira resolver tudo em dez minutos. Não se trata apenas de empurrar a bola pra dentro do gol. Há de se armar o time taticamente, planejar as jogadas, trabalhar a bola, fazer o trajeto defesa/meio-campo/ataque. Mas sem firula, sem firula…

Recomendo também que você manere no álcool. Se for beber, beba, mas não muito. Senão, não tem jeito mesmo.

Ah, e por último: goste da mulher. Sinta amor por ela. Com amor, você não broxa nem com a Bruxa do 71. É claro que, se ela for bonita, melhor ainda. Mas o fundamental é o sentimento. De nada adianta você pagar 1 milhão de dólares por uma noite com um monumento recheado de silicone: se não houver nada que “acenda a chama”, que levante o teu bilau, pra ser mais direto, tú vais broxar mesmo.

Mas é claro que tú podes ignorar tudo o que eu disse aqui e simplesmente comprar um Viagra e pagar uma mulher qualquer para satisfazer tuas vontades.

Seja lá qual for a tua escolha, boa sorte!


Rafael Rodrigues