Friday, June 30, 2006

O último dia

*Desenvolvido a partir de "Último Dia" de Paulinho Moska

Dizem que nesse dia, o céu foi invadido por imensas bolas de fogo. A multidão sabia que elas viriam, o jornal anunciará uma semana antes. Mas mesmo assim, muitos entraram em pânico.

Carlos abraçava sua esposa calorosamente, trocava palavras ao pé do ouvido, e dizia que a amava quase a cada minuto. Eles tinham suas desavensas, mas o amor era evidente.

Diego percebeu estar distante de todos seus amigos próximos, e a família não poderia chegar a tempo em sua casa. Permaneceu sentado bem no meio do sofá, olhando para nada, como quem se arrepende.

A polícia teve de conter os arruaceiros, que corriam desesperados pela rua, alguns completamente nus. Incrédulos de que aquele seria seu último e derradeiro dia.
Muitas pessoas, como Laís, gastaram todo seu dinheiro em roupas dentro de um shopping. Era estranho, mas as lojas ainda vendiam, exceto algumas que foram completamente saqueadas.

O Dr. André Pires manteve seus compromissos, reunião das 9h ao meio dia. Não que algum de seus clientes tivesse aparecido.

Roberto caminhava no meio fio da calçada, feliz que finalmente o final dos tempos estava por vir. Ele esperava que após isso, tudo estaria melhor.

Parece que muitos presos escaparam de diversas cadeias, ganharam passe livre para cometer os últimos sortilégios antes do grande final.

Aline chorava trancada em seu quarto. Apenas 14 anos de vida foram dados a ela, e agora, do céu que se tornava negro em plena tarde, o fim era anunciado.

Todos saíram de sua casa para assistir ao belo espetáculo. Trovões eram ouvidos. Causando mais pânico e dor. Frente as suas casas, as pessoas se abraçavam, com lágrimas nos olhos.

A princípio ninguém acreditou que eles estavam vindo em colisão com a Terra. Quando descobriram que era verdade e que vinham em alta velocidade, já era tarde demais.
Os que ficaram em frente a televisão, disseram que muitos presidentes se despediram, com pedindos desculpas. Parece que um canal de teve mostrou os últimos segundos dos famosos, só para o caso de alguma pessoa vazia se interessar.

O céu negro, em plena tarde, pintado com imensas bolas de fogo. Foi o último dia de todos nós. Muitos, enquanto viam aquele belo espetaculo, ainda pensavam o que iriam fazer quando chegasse o último dia de suas vidas...


Thiago Augusto
(21-12-05)

Wednesday, June 28, 2006

As invenções da imprensa (na Copa)

Eu queria ter feito uma brincadeira no título. Teria de ser "A invenção da imprensa", pra citar o Gutemberg (Johann, que inventou a imprensa por volta de 1450, permitindo assim que livros fossem impressos, ao invés de manuscritos) e tal, mas a imprensa não colabora. Ela inventa coisas demais.

A imprensa esportiva, no caso.

Muito antes da Copa de 2006, acho que na Copa de 2002, falava-se nos "3 R's". Até em "4 R's" falavam. Se não me engano: Ronaldo Gordo, Ronaldinho Jackson, Romário (que foi cortado pouco antes da convocação) e Ricardinho Babuíno.

Depois, em algum amistoso pós-penta e na Copa das Confederações, no ano passado, se eu não estiver enganado, falaram do "quarteto (ou quadrado) mágico". Houve quem quisesse um "quinteto mágico"! E aí veio a Copa do Mundo, e ninguém fala em outra coisa a não ser no tal quadrado: Ronaldo Gordo, Adriano, Ronaldinho Jackson e Kaká.

Certo.

Errado. O quadrado deu errado. Ronaldo e Adriano não podem jogar juntos. Descobriram o Brasil! Perceberam que dois centroavantes de área não podem jogar juntos. Tudo bem.

Pra não perderem o costume, inventaram que outro quadrado, o defensivo, deu certo. Juan, Lúcio, Émerson e Zé Roberto. Mas parece que não engoliram essa de "quadrado defensivo".

Tentaram ainda um "triângulo", do lado direito da seleção: Kaká, Robinho e Cafú. Também não foi bem aceito.

Foi quando inventaram "as torres gêmeas". Sim, Ronaldo Gordo e Adriano agora são as torres gêmeas. Sim, tipo as torres gêmeas que o Bin Laden mandou detonar. Uma torre já foi, Adriano deve sair do time, pois Robinho está detonando. Com trocadilho.

Eu não estou nem aí pra quadrados, triângulos, quintetos, hexágonos, heptetos, octágonos... Só quero ver a seleção jogando bem, e ganhando essa Copa. O resto, é invenção da imprensa.


Rafael Rodrigues

* Sou preguiçoso demais para pesquisar a veracidade dos dados informados nesse texto. Tipo: "quando foi a Copa das Confederações?" "Quando falaram pela primeira vez em quadrado mágico?" "Quando falaram em 3 R's?" Mas tudo que aqui foi dito, foi baseado em notícias que saíram em jornais, revistas e programas de tv.

Sunday, June 25, 2006

Humano

Eu não sou herói
Não tenho mais a pretensão de salvar mundo
Talvez ele nem queira ser salvo
Vai ver ele nem vivo esteja

Eu não sou igual a todos
Tenho minhas aspirações, meus sonhos
Minhas milhares de canções favoritas, até ontem; meu prato predileto
Choro por motivos que para outrem talvez fossem razão de riso

Eu não sou perfeito
Não sou perfeito para você, muito menos para mim
Tenho mais defeitos que possas apontar
Mais virtudes do que possas vir a merecer

Eu não me sinto completo
Ainda não conheci o mundo
Não plantei árvores, nem concluí sonhos
Morri de amores 10 vezes e continuo a morrer um pedacinho cada dia


Eu não sei se sei quem sou
Às vezes sei o que quero, o que não gosto
O que amo e o que abomino
Pouco ainda sei, porém, de mim mesmo

Eu sou sonhador, sou sério, bom
Sou adulto, sou moleque
Frio, sensível, tirano
Inseguro, convicto, confuso... humano

Eduardo Leite

Thursday, June 15, 2006

Demônio íntimo

Os dias são curtos, nunca há tempo o bastante
As noites são longas, você não sai de meu pensamento
Não como uma saudade boa, algo que dê prazer
Mas uma voz martelando, uma tortura, difícil descrever

Você sabe todos os podres, os pontos fracos
Fala quando quer, sempre para deixar-me atordoado
Elogios esperam retorno, favores, subornos
Humilhações rotineiras, melhor seria um aborto

Sua voz doce e meiga dificilmente vem aos meus ouvidos
Fácil enganar os outros, não por muito, mas o suficiente, enfim
Você só vê a si mesma, seus planos, seus desejos
Todo o resto são obstáculos ou marionetes servindo a seu fim

Conversa não faz parte de seu vocabulário
Grito e violência, esses sim, estou familiarizado
Convivência é sempre uma surpresa, estou de acordo
Me surpreendendo, ainda, em situações onde nem reconheço meu rosto

Odeio-te com mais fúria que amo
O amor é um costume que pouco durará
Odeio a mim, como ajo, involuntariamente manipulado
Preferiria dar vazão ao diabo que habita no inconsciente sepultado

Poucos devem ser cuidados, amados
Os inimigos destruídos, torturados e humilhados
Compaixão parece fraqueza, por sempre deixar atordoado
Perto da hora do pagamento, acabo esquecendo o trato

O rancor corrói minha alma, cada dia humilhado
Espero em vão o dia em que serei vingado
Gostaria apenas de sair, pelo vento guiado
Na bifurcação da vida, terceiro caminho enveredado

Não quero chegar a vê-los no fim, mostrar qualquer sentimento disfarçado
Cansado de máscaras, anseio por livrar-me deste elmo desgastado
Continuar com o escudo sempre empunhado
E a espada desembainhada esperando o momento adequado

O fraco jaze no passado
O prato frio colocado em minha mesa
Servirá não como virtude, mas como início de hábito
O fim está próximo, vislumbro pelos olhos do passado


Eduardo Leite

Tuesday, June 13, 2006

O vício

Sou um viciado. Sim, um viciado, dependente. E não tenho como me tratar. Não existe tratamento para o meu vício. Nem tenho motivos para pensar em fazer isso. Devo mesmo é alimentá-lo, sempre.

Sou viciado em uma branquinha. É como chamam ela. É o seu apelido mais famoso. Quando saio com meus amigos, a chamamos assim. “Um brinde à branquinha!” E erguemos os copos.

Faço tudo melhor com ela. Trabalho melhor, me sinto melhor, estudo melhor. A branquinha me inspira. É certo que ela me deixa sonolento e cansado algumas vezes. Isso acontece nos fins de semana, quando passo mais tempo com ela. E nossas noites são memoráveis.

Apenas nós dois, no sofá, ao som de alguma música romântica. Ninguém por perto. Apenas eu e ela. Nessas horas, não preciso de mais nada. Afinal, estou com minha branquinha. E só ela me entende.

Minha branquinha. Ah... Não posso viver sem ela.

É como eu disse antes. Sou um viciado. Viciado em minha branquinha.

Não sei porque tem homem por aí que não quer a companhia de uma. Esses eu vejo tristes, sozinhos em mesas de bar, se lamentando, bêbados, em estado deplorável.

É porquê não têm uma branquinha como eu tenho.

Minha branquinha não me deixa ficar bêbado. Aliás, foi por causa de minha branquinha que parei de beber. Antes dela, eu vivia bebendo por aí, como os tais tristes citados acima.

Hoje mais não. Hoje só bebo quando estou com minha branquinha. É quando abrimos um bom vinho e nos amamos feito loucos.


Rafael Rodrigues

Monday, June 12, 2006

Mais Uma Vez ou Once More With Feeling

Já começou de novo outra vez. Da flor já nasce espinhos, tão finos que fazem o corte arder depois de horas.

Já nasce uma cor que brilha amarelo indo ao encontro do azul. Que num abraço despertam o verde em contraste. Aos poucos transformando a maré.

Já existe a fotografia inexistente gravada pela imagem das retinas. Fazendo a memória se perder em desvarios.

Começou de novo, outra vez. A mistura das antíteses, das horas, fazendo o velho clichê de tudo ser nada.

Começou tudo outra vez.

Thiago Augusto
(24-11-05)

Saturday, June 10, 2006

São Jeremias - Parte II

Comunicou-se com seu amigo que cursava medicina na época, após um breve esclarecimento da situação, e não sem muita insistência, conseguiu um falso diagnóstico de esquizofrenia de um médico supostamente residente em Aracaju e foi remanejado para o São Jeremias por excesso de contingente nas demais instituições.

Daniel chegou não muito confortável ao seu novo e temporário lar com uma belíssima camisa de força e após um breve exame do médico residente (superficial para dizer o mínimo) ele foi injetado com alguma substância que o ajudou a esquecer-se onde estava. Acordou no outro dia.

“Devo ter tomado todas!”, pensou e logo que caiu em si viu os “loucos” ao seu redor. Uns cheiravam seu corpo, outros o apalpavam e outros apenas olhavam. Levantou-se em um sobressalto e saiu atordoado e compadecido das figuras quase fantasmagóricas que agora desviavam-se de sua vista em direção à penumbra, de onde tinha apenas a sensação de ser observado. “Filho bastardo de barão ou inimigo político de alguém?” foi o que uma vulto perguntou-o antes de revelar-se à luz.

continua...

Eduardo Leite

Tuesday, June 06, 2006

Desejo

Ela me conhece desde pequeno. Não lembro ao certo com que idade a vi pela primeira vez, mas creio que foi por volta dos meus cinco anos.

Filha de uma vizinha, ela ajudava minha mãe nas atividades domésticas. Família simples, gente honesta. Era como minha irmã de criação.

Sempre que podiam, meus pais ajudavam a sua família. Uma mão lava a outra, e não sei quem lavou a de quem primeiro. E isso pouco importa.

Importam apenas as lembranças que tenho dela. Lembro de ela me dando banho. Brincando comigo. Fazia minha janta e comia comigo vendo tv. Com o passar do tempo, essa mordomia acabou. Eu estava crescendo. E outras coisas também.

Ela também crescia. E eu começava a vê-la não como irmã de criação, e sim como mulher. Certa vez vi seus seios. Ela estava passando roupas e abaixou-se para pegar algo, não lembro ao certo - e não importa. Foi a primeira vez que me senti homem.

Pensando que a vida era como nos filmes e novelas, achei que fosse me iniciar sexualmente com ela. E como eu queria aquilo. Aquela morena de coxas grossas e seios firmes era a mulher mais bonita que eu já havia visto. Eu não conseguia mais disfarçar meus olhares para suas formas abençoadas.

Mas nada aconteceu. O tempo acabou por nos afastar. As obrigações do dia-a-dia (ela, mulher, começou a trabalhar, pensava em casar, eu, homem feito, comecei a trabalhar, e jamais pensei em casar, primeiro estudar) se colocaram entre nós. Além disso, ela sempre me viu como um irmão.

De todos os anos de convivência ficou apenas o desejo. O meu desejo.


Rafael Rodrigues

Sunday, June 04, 2006

Um Romance

Eu tinha algumas idéias claras em minha cabeça naquela manhã. Desci do ônibus na hora do almoço escrevendo mentalmente as melhores frases que eu poderia escrever. Sem dúvida minha falta de inspiração crônica finalmente cessaria.

Minhas melhores idéias surgem de três formas: Quando estou sem dormir, quando estou em movimento e assim visualizando o mundo ou quando estou divagando nos entre atos dos sonos.
Pena que fui vitima das editoras brasileiras e do publico que o leu. Fiz de meu primeiro livro meu gigantesco sucesso. Era uma história simples. Ou deveria dizer, mas uma historia sobre um amor banal. Se as personagens realmente existissem, a essa hora o amor já teria ido para as cucuias e eles estariam no divorcio.

Mas foi assim que escrevi meu primeiro romance. "Absorções". O titulo estúpido foi me dado por minha esposa. Na época soava interessante, fazia sentido com a personagem. Hoje é uma baita porcaria.
Assim, com essa obra prima e todas as outras bobagens ditas na época, fiz minha cova com capa cartonada, 245 páginas impressas em papel canson com fonte garamound.

O primeiro foi quase um contrato unilateral. Eu entregava o original na mão da major, eles lançariam. Se sobrasse um lucrinho nisso tudo, o autor receberia uma quantia insignificante.
Com meu sucesso ganhei entrevistas em programas de tv. Contratos. Uma coluna no jornal. E taradas dizendo que me amavam só porque achavam que eu era uma espécie ambulante daquilo que escrevo.

Respondi diversas vezes que já tinha algumas historias engatilhadas. Pequenos plots, ou alguns inícios que escrevi anos-luz atrás. E que agora com amadurecimento talvez ficariam ainda melhor.

Meu segundo livro foi a moda de Lispector. Uma introspecção através de uma personagem feminina. Tive dois desafios para superar: O meu lado masculino que deveria estar ausente no texto, e conseguir passar tudo que queria para a personagem sem soar piegas.

Quando foi lançado, no natal de 2003, o livro vinha coberto por uma pequena aba que anunciava "O segundo romance de Gustavo Filho, autor de 'Absorções' aclamado pela crítica especializada". Quando recebi a edição pronta em casa semanas antes do lançamento, percebi que nem tudo foi aprovado por mim. Alguns comentários de escritores renomados foram inseridos na contra-capa.

Posso parecer desagradecido por não gostar de comentários calorosos de pessoas como Luis Fernando Veríssimo, Arnaldo Jabor e de alguns outros jornalistas. Mas sei o quanto esses comentário são comprado$.
Quando ocorreu seu lançamento, naufraguei. O publico esperava um outro amor tão original quanto o outro. Mas eu queria só contar historias. E elas nascem as pencas e não possuem formula nenhuma.

A critica não me massacrou. Houve um grupo que elogiou a mudança. Eu era um escritor e não um caçador de best sellers.

Nessa época, todas minhas idéias guardadas continuaram escondidas. Tudo que desenvolvia me soava insosso, como se faltasse minha emoção. Percebi que agora que tinha um publico, comecei a ser cobrado. Tinha todos os passos vigiados. Minha palavra era lida com desprezo. Como se eu não retribuísse o publico. Eles me odiavam por não fazer o mesmo romance duas vezes.

Resolvi no final do ano passado abrir espaço para meu próprio ego, algumas licenças poéticas, personagens fictícias e narrei minha própria historia. E enviei para outra major. Dessa vez pedindo controle total sobre o produto final. Ainda me doía saber que não fui querido porque tentava não ser repetitivo.
Lancei em maio meu terceiro livro "Ego de um Artista", homenageando o nome da obra de Joyce ao meu estilo. E esperei.

"Gustavo Filho estava de volta, mas será que ainda precisamos dele?", diziam os jornais. Com o tempo fui recebendo críticas positivas. O publico pareceu compreender minhas idéias com mais liberdade. Eu andava na rua e eles diziam que somente depois da leitura desse novo romance que minha segunda obra fazia sentido. Nessa hora eu só pensava em quão volátil era o publico. E quão maluco.

Hoje iniciei a segunda parte de meu primeiro livro, possivelmente "Absolvições". Anos se passaram desde que uni Junior e Tatiana. O tempo foi sábio e doloroso. Voltei a encontrar velhos personagens que jantarão ainda hoje comigo para contar aonde a vida os levou.
Sei que isso desagradará o publico. Mas percebi que todas as personagens são projeções de diversas vidas que passam na nossa janela. E assim como nós, elas também devem seguir em frente.

Thiago Augusto
(26-09-05)