A voz do escritor
"Meu tema é o escrever imaginativo e como lê-lo: primeiro como um escritor desenvolve uma voz própria e uma presença na página; a seguir, como o leitor aprende a escutar essa voz e reagir a ela, e, finalmente, como a verdadeira voz e a personalidade pública às vezes entram em choque, se confundem e se contradizem."
É assim que o escritor e crítico literário inglês A. Alvarez inicia o prefácio de seu livro "A voz do escritor" (Civilização Brasileira, 160 págs.).
É bom deixar claro que não se trata de um manual a ser seguido, ou uma cartilha. Afinal, não existem regras que todo leitor ou escritor deve seguir. E A. Alvarez não propõe isso. O que ele faz em "A voz do escritor" é partilhar um pouco de sua experiência com quem se dispõe a ler sua mais recente obra publicada em terras tupiniquins.
Na primeira parte do livro, Alvarez cita vários autores e nos mostra como ou em que momento de suas vidas eles encontraram a tal "voz" própria, que não é a mesma coisa que "estilo": "Estilo, como já disse, é diferente de voz, e às vezes o estilo que você tanto trabalhou para adquirir - o seu estilo - atrapalha o que você quer dizer."
Já a definição de "voz", Alvarez deixa por conta de Philip Roth, que diz: "Não pretendo ter estilo... Eu quero ter voz: algo que começa mais ou menos na parte de trás dos joelhos e chega até bem acima da cabeça."
A segunda parte de "A voz do escritor" é dedicada aos leitores. "O bom leitor escuta (a voz) com a mesma atenção com que o escritor escreve, ouvindo tons e subtons, alterações de altura, e tão envolvido e atento como se estivesse numa conversa com o escritor." E mais: diz que ler "É até mesmo, a seu modo, uma arte."
Esse leitor a que Alvarez se refere é o leitor que busca na literatura algo mais que uma simples leitura. É o leitor que deseja compreender a obra em toda sua amplitude, que deseja descobrir o que se esconde nas entrelinhas.
"O culto da personalidade e o mito do artista" é o título da terceira e última parte do livro. Nela, Alvarez disserta sobre o fato de hoje existir um "culto da personalidade" que antigamente não havia. Ele conta quando isso provavelmente começou. Em 1966, Alvarez foi a uma leitura de poesias que o americano Allen Ginsberg (autor de "O uivo", poema idolatrado pela geração beatnick e por seus seguidores, até hoje) promoveu na universidade de Buffalo, em Nova Iorque: "O público era grande demais para um auditório, de modo que ele se apresentou no ginásio de basquete, que tinha assentos para centenas de pessoas (...) Agora compreendo que o que eu estava presenciando naquela noite em Buffalo era algo novo e estranho: a transformação da poesia em showbiz."
Contando casos, analisando poemas, reproduzindo declarações de autores, A. Alvarez não enumera regras em seu "A voz do escritor". Ele aponta caminhos. É como naquele ditado: "melhor que dar o peixe, é ensinar a pescar", ou algo semelhante.
Portanto, quem realmente gosta de literatura, seja escritor ou leitor, não pode deixar de conferir os conselhos de A. Alvarez.
Rafael Rodrigues
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