Tuesday, March 21, 2006

Last but not least


Espirais psicodélicas, cores verde-limão, verde lodo, marrom, escuridão total. As imagens foram das cores mais quentes e ofuscantes aos tons neutros, culminando na ausência de todas elas.

Assim correram seus pensamentos, embaralhados, perdidos, disformes. Não pensava o porquê, apenas pensava, ou fantasiava. Simplesmente não sabia o certo o que era, apenas estava.

Vácuo, vazio, nada, sussurros. Sussurros? É, de repente podia ouvir barulhos indistinguíveis, batidas, conversas muito distantes de si, talvez em outro dialeto ou como em um filme em câmera lenta, em câmera lenta assim como seu pensamento estava: sonolento, calmo, lento. Vazio novamente.

Sons outra vez. Podia distinguir os tons, eram seus pais e sua irmã. Não conseguia falar nem abrir os olhos. Deus! O que acontecera? Só restava esperar e continuar ouvindo o que falavam.

Aos poucos seus olhos abriram, e a festa foi total entre os que estavam em seu quarto... branco? Como fora parar em um quarto branco? Puta que o pariu! Estava em um hospital, o que aconteceu? Será que perdera algum membro? Se conseguisse sentir algum membro do corpo talvez descobrisse, pena que sentia-se ainda anestesiado. Anestesiado demais para falar, mas isso não importava no momento, e sim os abraços que recebia, pelo menos ele os via, apesar de não os sentir.

Quatro horas se passaram e sua mãe não falava nada que não fosse o quanto sofrera e o quanto sua namorada ligara para saber de deste. Queria desesperadamente perguntar o que houve consigo, mas ninguém tocara no assunto. Talvez devesse ir embora, sua mãe não se importava com outra pessoa que não fosse ela mesma, por isso falava pelos cotovelos, para chamar atenção. Opa! Havia feito isso antes... antes de parar nessa cama. O que acontecera errado em sua fuga? Precisava desesperadamente saber.

O médico entrou em seu quarto e dirigiu-se para onde estava deitado. Pediu que piscasse duas vezes os olhos se entendesse e/ou concordasse com o que ele estava falando e uma vez para a negação. Contou algo sobre o estilhaçamento da lombar e à extração de ossos cranianos esmagados pela batida, isso não fazia muito sentido, mas o fato de não sentir do pescoço para baixo fez todo o sentido. Neste momento empalideceu, perplexo com o que ouvira não conseguia mais piscar os olhos inundados com lágrimas. Era um sonho ruim e queria acordar. Fechou seus olhos e resolveu não os abrir mais.

Sua namorada não o visitara, queria lembrar-se dele quando ainda andava e fazia todas as coisas que a alegravam. Também não o veria mais no primeiro ano do ensino médio de sua escola, ele não tinha motivação para mais nada que não fosse passar as manhãs e tardes olhando para o quintal de sua casa pela varanda, onde ficava a ler seus livros e sonhar com suas histórias que seriam publicadas em um livro. Não pensava mais em como estava, mas no que era e definhou rapidamente, mesmo com a visita de seus amigos e parentes, com os choros e incentivos à melhora.

Haviam pego o responsável por atropelar-lhe, quando este saia da casa de sua namorada em direção à estação de ônibus. Ele fora preso e pagaria pensão pro resto da vida da vítima, mas a vida da vítima não parecia ser muito tempo. Dinheiro já não significava nada. Nada mais esperava senão a morte. Esta não o abandonou, não teve pena de sua situação, tampouco teve pudor em olhar-lhe face-a-face antes de tomar-lhe em seus braços já que este estava por demais cansado para caminhar.


Eduardo Leite

1 Comments:

At Wednesday, March 22, 2006 6:20:00 PM , Blogger 3 Vozes said...

Só posso dizer uma coisa pra você sobre este conto, Dudu: meus parabéns. Tá muito foda. Abraço!, Rafael

 

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